sexta-feira, 28 de maio de 2021

As Origens do COVID 19 na China sem adequada Regulação Ético-legal de Pesquisa


Este texto levanta a questão de algo denominado em Bioética de “conhecimento perigoso”, o qual, segundo HR Potter é “aquele conhecimento que se acumulou muito mais rapidamente que a sabedoria necessária para gerenciá-lo.” O conhecimento torna-se perigoso, por exemplo, nas mãos de ideólogos, burocratas e especialistas carentes de um adequado comportamento ético e moral, pois para alguns deles “vale tudo”. 

A Ciência Biomédica é um espaço onde a discussão séria e ampla da regulação ético-legal da investigação científica é fundamental. Sem esta discussão, corremos o risco de nos tornamos o Doutor Frankenstein,  protagonista do espetacular e profético romance de Mary Shelley. Passamos a criar monstros. Além disto, a utilização ideológica, especialmente pelos regimes de viés totalitário (de qualquer cor), dos conhecimentos e técnicas científicas é um risco sempre presente. 

A “Medicina Desumana” (em alemão, ”Medizin ohne Menschlichkeit") que se tornou evidente para a Humanidade com os experimentos em seres humanos pelos nazistas e que ainda permeia a atuação médica, segundo Dingwall & Rozelle (1) não se limita ao Nacional-Socialismo. Ocorreu e ocorre em diferentes países, facilitada por "...um tipo de pensamento, de uma visão de mundo, em que os seres humanos são “apenas animais”, aglomerados de moléculas e, portanto, coisas, objetos passíveis de serem usados como cobaias”.

Na maioria dos países, incluindo o Brasil, a experimentação Biomédica, a partir do julgamento de Nuremberg, passou a ser estritamente regulada, produzindo um marco não apenas em termos de ética da experimentação em humanos, como também em animais e mesmo em ecossistemas. Ainda assim, como aponta a Dra. Julia Black, "é crucial reconhecer que a presença de regulação ética não implica a ausência de barbarismo no tratamento ou na investigação envolvendo pessoas” (2). 

Um princípio a ser considerado sempre é o da Precaução (3). Segundo Hans Jonas, a existência de “risco de um dano sério ou irreversível requer a implementação de medidas que o possam prevenir”. Este é o trabalho dos bioeticistas e médicos envolvidos com a Ética Médica.

Atualmente, há uma série de experimentos sendo feitos na China que usam o conhecimento científico disponível sem adequada regulação ética, o que torna perigoso este conhecimento, não só para a Saúde, mas também para a integridade da pessoa humana, e mesmo para a continuidade das conquistas da Civilização. Especificamente em relação à Investigação Biomédica, alguns dos conhecimentos perigosos tem gerado experiências dignas de um Dr. Frankenstein, incluindo:

1) o uso experimental de embriões humanos, como por exemplo o emprego de tecido cerebral de bebês abortados para desenvolver produtos médicos, como o faz e apregoa o Dr. Hongyun Huang, neurocirurgião de Beijing, que trata lesões de medula espinal e doenças neurodegenerativas com tecido cerebral de bebês abortados (4). 
O projeto, aprovado localmente pela Direção de seu hospital, passou a ocorrer apesar de ser “proibido” na China, talvez porque naquele país a regulação ética não significa regulação legal. Ou ainda, talvez porque o objetivo do Dr. Huang e das revistas chinesas que divulgam seu trabalho “pioneiro” seja fazer da China o “líder mundial nos transplantes celulares”.

2) outro tipo de experimento em embriões humanos foi realizado por He Jiankui, um biofísico, da Universidade de Shenzen, o qual, com euforia, anunciou em 2018 que havia usado duas meninas gêmeas em estágio embrionário para a edição de genes por “CRISPR-Cas9” visando induzir resistência ao vírus da AIDS. Estas “cobaias embrionárias” não tiveram o direito de assinar um consentimento para o uso desta técnica que pode, com elevada probabilidade, gerar anomalias congênitas não apenas nas meninas, mas também futuramente em sua prole (CHINA NEEDS STRONGER ETHICAL SAFEGUARDS IN BIOMEDICINE - AS THE COUNTRY SEEKS TO BECOME A RESEARCH POWERHOUSE, IT MUST RECTIFY WORRISOME PRACTICES (Scientific American, editors - Outubro de 2019).

3) clonagem de embriões humanos e de animais, as denominadas “Quimeras”. Na Mitologia, as quimeras eram representadas como seres híbridos com cabeça de leão, corpo de cabra e rabo de serpente. Pois hoje, é possível produzí-las através da fusão de células fonte (estaminais) embrionárias humanas com as de animais, com embriões de animais, ou mesclando as células de animais entre si. São produzidos embriões mistos em laboratório. Foi o que se passou recentemente num projeto compartilhado entre China e uma Universidade da Espanha, país no qual este tipo de experimento é proibido tanto ponto de vista ético como legal. Na China, a “clonagem terapêutica e experimental humana” é permitida, desde que sem implantação uterina. MAS (em maiúscula) a implantação destas quimeras animais - humanos ocorre, pois não há adequada regulação. 
Assim, “cientistas espanhóis criaram na China um ser hídrido, homem-macaco, utilizando a implantação de células-fonte humanas em embriões de símios. Segundo informações das revistas Galileo e El País, a “quimera” foi sacrificada durante a gestação” (Galileo, El País, 2019). Foi mesmo? Quem sabe...
Estrella Núñez, bióloga e vice-reitora de pesquisa da Universidade Católica de Murcia (UCAM), considerou o experimento importante para que animais de outras espécies possam virar, no futuro, “fábricas” de órgãos para transplantes.

4) Finalmente, o tema deste escrito, diz respeito especificamente, ao emprego de um método denominado “Gain of Function Research” (GOFr), também chamado de “Research involving potential pandemic pathogens" (PPPs) e que consiste no “aumento experimental do potencial infetante e patogênico de um vírus para caracterizar o risco de causar pandemia.

Por que a China?

O PC Chinês lançou Programa (Agenda) denominado MADE IN CHINA 2025, que visa levar aquele país a liderar as ciências aeroespacial, de robótica, energia limpa, transporte e Ciências da Saúde. Em Medicina, percebemos nos programas digitais de busca como o Pubmed uma enxurrada de artigos produzidos na China, alguns interessantes, mas muitíssimos de qualidade discutível. 

Este Programa assume uma moral que em Chinês é chamada de “jigong jinli”, traduzível “como sucessos rápidos com ganhos a curto prazo” (5, 6). 
Ou seja, pragmatismo da pior espécie, o vale-tudo.

A “Regulação Bioética” é ineficaz na China (https://www.scientificamerican.com/article/china-needs-stronger-ethical-safeguards-in-biomedicine/?print=true). As primeiras diretrizes de Ética Médica foram produzidas por lá apenas em 1980, seguindo a proposta de serem “baseadas nos princípios da comunidade científica internacional”, MAS (maiúscula) como descrito acima, não implicam regulação legal. 

Os Comitês Ética locais são despreparados nas questões regulatórias, bem como os cientistas e médicos pois não têm formação relacionada a princípios éticos e comunicação com pacientes. Não há valorização dos “interesses do paciente” e da autonomia da pessoa. A comunicação médico-paciente costuma ser feita aos familiares, ou mesmo a eventuais "conhecidos".  A solicitação de um Consentimento Informado não é uma prática eticamente recomendada, muito menos uma determinação legal, na China. 

E não há informações adequadas sobre como o Consentimento informado para investigação em ensaios clínicos é obtido na China. 
Um exemplo foram os experimentos da companhia Pukang Biotech, a qual ilegalmente comercializou uma vacina contra hepatite sem ter autorização de qualquer Agência Reguladora chinesa. Testaram a vacina em crianças de escolas da Província de Anhui, tendo causado doença em centenas de crianças e mesmo uma morte (7).

Lei R, et al. citam a continuação de um “pensamento eugênico” entre os professores universitários chineses, visto que em livros textos de Medicina publicados recentemente, entre 2010 e 2015, ensina-se que “pessoas deficientes” são (em Chinês) “liesheng”, ou seja, inferiores e um peso para a Sociedade, sugerindo que deveriam ser esterilizadas, mesmo com o uso da força para evitar que tenham filhos (8).

E o que decorre desta “desregulação da investigação bioética na China”? 

Que grupos de cientistas investigadores internacionais associados a colegas chineses, fazem na China experimentos que são proibidos em seus próprios países, como foi o caso das quimeras entre humanos e símios pelos espanhóis.

Um destes experimentos envolveu o uso da técnica de "Gain of function" para potencializar o vírus SARS-COV (https://www.newsweek.com/dr-fauci-backed-controversial-wuhan-lab-millions-us-dollars-risky-coronavirus-research-1500741). Em 2019, o National Institute for Allergy and Infectious Diseases, dos Estados Unidos, sob a liderança do conhecido Dr. Fauci, financiou o trabalho de cientistas do Instituto de Virologia de Wuhan em pesquisa envolvendo “gain of function research” utilizando coronavírus de morcegos. 
O Instituto de Saúde dos Estados Unidos (NIH) em 2019 despendeu milhões de dólares para iniciar e desenvolver estes experimentos em morcegos que haviam sido previamente coletados em outro projeto de Pesquisa com os chineses, financiado pelo NIH e iniciado em 2014. 

Houve críticas de pesquisadores internacionais contra estes experimentos devido ao potencial risco de contaminar seres humanos, mas o Projeto EcoHealth Alliance, dirigido pelo Dr. Peter Daszac, envolvendo "gain of function research", só deixou de ser financiado em Abril de 2020, quando a epidemia já tinha dimensões pandêmicas.
Entre os objetivos do projeto constam (aqui vou manter em Inglês pois são detalhes que, embora fundamentais, não interessa a muita gente a não ser médicos e investigadores biomédicos: 

We will use S protein sequence data, infectious clone technology, in vitro and in vivo infection experiments and analysis of receptor binding to test the hypothesis that % divergence thresholds in S protein sequences predict spillover potential."

Ou seja, testaram a “capacidade de um vírus modificado por engenharia genética de ser transmitido de um animal para um ser humano, o que requer que o vírus seja capaz de ligar-se a receptores das células humanas. O COVID-19, por exemplo, tem a estratégia de ligar-se ao receptor ACE2 nos pulmões e outros órgãos.  

Segundo Richard Ebright, infectologista da  Rutgers University, estes experimentos “aumentam a habilidade do coronavírus de morcego, por engenharia genética, de infectar seres humanos". Ebright foi uma voz de oposição a estes experimentos de “gain of function”.
O debate dura já uma década na Comunidade científica Internacional pelo risco de escape (“spillover”) laboratorial com as consequências devastadoras de uma Pandemia (Newsweek, 28/04/2020).  A Inteligência dos Estados Unidos, após haver originalmente considerado a possibilidade de mutações naturais ocorridas nos vírus de morcego, já em 2020 passou a considerar como provável um escape laboratorial do vírus SARS-Cov-2, o mundialmente conhecido COVID-19, fruto de manipulação genética (Rebecca Ttagger. US FUNDER ENDS CORONAVIRUS RESEARCH WITH WUHAN LAB AMID POLITICAL PRESSURE.  https://www.chemistryworld.com/news/us. 5 MAY 2020).

Traduzo e agrego aqui uma das conclusões do artigo “The proximal orgins of SARS-COV-2” publicado na revista NATURE MEDICINE (2020; 26:450–5), que tem sido citado como a “opinião da Comunidade Científica” favorável a um processo mutacional natural do vírus SARS-Cov: 

“Pesquisa básica envolvendo modificações induzidas nos Coronavirus semelhantes ao SARS-COV de morcegos em culturas celulares e/ou modelos animais tem sido realizadas há muitos anos em laboratórios de nível elevado de Biossegurança em todo mundo, e há relatos documentados de escapes de vírus SARS-CoV de alguns laboratórios. DEVEMOS, PORTANTO, EXAMINAR A POSSIBILIDADE DE UM ESCAPE LABORATORIAL DO SARS-Cov-2 (na origem da Pandemia). Em teoria, é possível que as mutações RBD adquiridas pelo vírus tenham ocorrido durante a adaptação às modificações induzidas na cultura celular, como tem sido observado em estudos com vírus SARS-Cov".

Para mim, pessoalmente, ficou evidente que algo como este escape de um vírus animal adaptado a humanos (spillover) previamente narrado deve ter acontecido, ao ler nesta semana uma reportagem da revista italiana  QuotidianoNazionale, em que se afirma (pela primeira vez) que a doença afetou funcionários investigadores do Instituto de Virologia de Wuhan logo nos primeiros momentos da Pandemia

Ou seja, a infecção já se alastrava entre os funcionários do Instituto de Virologia quando o primeiro surto surgiu, sugerindo que pode ter se originado naquele centro de pesquisa
Este dado ficou ocultado e representa um detalhe fundamental na sequências dos eventos ocorridos em Wuhan (vide: https://www.quotidiano.net/cronaca/virus-in-laboratorio-nuovi-sospetti-gli-scienziati-indagare-ancora-in-cina-1.6410279?fbclid=IwAR2IPPYs-Wv9thqTyBFJBloId_0WMgl5y-J63E9fUYkbohpjscOGB-4QIxg)

Tomara que o Presidente Biden tenha sucesso (e poder suficiente) para aclarar esta questão. Temos todos o direito de saber a verdade e exigir que, sendo real que o escape de um vírus geneticamente modificado seja a causa de milhões de mortes e de um transtorno incomensurável em todos os países, este tipo de experimento, assim como os outros absurdos citados acima, NUNCA MAIS sejam realizados. Mas, provavelmente, neste momento já seja impossível obter as provas.

E deixo aqui minha homenagem ao Dr. Li Wenliang (foto abaixo - 12 de Outubro de 1986 – 7 Fevereiro de 2020), oftalmologista Chinês que trabalhava no Wuhan Central Hospital, e que ao perceber o surgimento dos casos de infecção por COVID19, denunciou nas redes sociais a existência de uma epidemia ocultada. Acabou preso pelo PC Chinês e morreu devido à doença alguns dias após.



Referências:

1) The Ethical Governance of German Physicians, 1890-1939: Are There Lessons from History? The Journal of Policy History 2011;23:1. Cambridge University Press, 2011.
2) Black, J. Constructing and Contesting Legitimacy and Accountability in Polycentric Regulatory Regimes. Regulation & Governance 2008;2:137-64. 
3) Goldim JR. A Avaliação Ética da Investigação Científica de novas drogas: a Importância da caracterização adequada das fases de Pesquisa. Revista HCPA 2007; 27(1).
4) Cyranoski D. Consenting adults? Not necessarily... Nature 2005; 435: 138–139; Cyranoski D. Fetal-cell therapy: paper chase. Nature 2005; 437: 810–811.
5) Wolfgang Hennig. Bioethics in China - although National Guidelines are in place, their implementation remains difficult. EMBO Reports 2006;7(9):850-4. 
6) Ruipeng Lei, Xiaomei Zhai, Wei Zhu. Reboot ethics governance in China - the shocking announcement of genetically modified babies creates an opportunity to overhaul the nation’s science. Nature 2019; (May);569:184-6.
7) Wolfgan Hennig. Bioethics China. EMBO REPORTS 2006;7(9):850-4).
8) Ruipeng Lei, Xiaomei Zhai, Wei Zhu. Reboot ethics governance in China - the shocking announcement of genetically modified babies creates an opportunity to overhaul the nation’s science. Nature 2019;569:184-6.



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