sexta-feira, 10 de abril de 2020

"o maior dos homens é o que serve a todos"


As tradições são geradas ao longo de séculos pela ação dos povos e seus expoentes: heróis, génios inspirados, homens justos, santos. E ao longo dos séculos, as tradições cristalizam-se, envelhecem, tornam-se incompatíveis com os tempos novos, enrijecem ao tentar barrar o que há de melhor no que lhes parece distinto do que elas contêm: o outro, o diferente.
A tradição torna-se então o cadáver do espírito que a gerou.
As grandes almas, pessoas que espontaneamente expressam o melhor da essência humana e, portanto, da essência das tradições, poderão ser elementos perigosos aos olhos de uma tradição que se tornou o oposto de seus ideais. Vejo assim Jesus, não somente em relação à tradição judaica, mas em relação as demais tradições. 
Não foi o Herói grego, vencedor de batalhas, mas mostrou o ápice do heroísmo ao confrontar os formalismos religiosos e os conluios políticos, mantendo-se íntegro, defendendo o que acreditava até a morte.
Não foi o doutor da lei, mas viveu a lei do Deus que amava, a cada momento.
Não foi o poderoso Messias libertador de algum povo, pelo contrário, mas com sua vida, transformou a Humanidade.
Não foi o rico cidadão romano, mas seu poder penetrou as almas sensíveis, modificando a história.
E assim, viveu o que ele mesmo era e acreditava, narrando parábolas, simples lições de vida, numa língua arcaica e desconhecida para o grande mundo, ensinando para pescadores, alguns deles analfabetos, numa apagada região do Oriente Médio. Não criou uma religião, viveu a sua própria.
Todo o Evangelho tem a marca de sua personalidade, incluindo arroubos juvenis, gestos de amizade terna, palavras de um enorme coração e de uma mente sábia, a dolorosa confrontação com o sacrifício, quando a grandeza se mesclou à perplexidade, a humildade imensa, o silêncio honesto diante da pergunta crucial que lhe fizeram: o que é a Verdade?
Um personagem poderia ter sido criado para gerar a nova religião, mas jamais essa personalidade pujante, verdadeira, amorosa, humilhada e vencedora. Tudo ali é absolutamente humano, inesperado, autêntico, como os atos de algumas pessoas especiais que passam em nossa vida, criando e enriquecendo incansavelmente a comunidade, sem grandes discursos, ou brilhos. Gente simples, silenciosa e maravilhosa. O Homem pode ser assim.
E ele foi também o sensitivo, o curador, o vidente. Ele também demonstrou, escandalosamente, aos homens comuns os grandes potenciais da espiritualidade. Talvez por isto, após sua morte, tenha sido entronizado como Ídolo, à maneira das divindades romanas e a Igreja, bem como os posteriores cultos cristãos que a seguiram, tornaram-se o oposto daquele espírito inicial, a sua Sombra prepotente, rígida, moralista, mercantilista, fanática. Contudo, o surpreendente é que a personalidade de Jesus foi e é tão grande que consegue transcender à Ideologia e ao Império, ambos decaídos, estando ainda hoje a propor caminhos a toda a gente, confortando a qualquer um, independente de ortodoxias e cultos.
E qual a essência da mensagem que rompeu a História e mudou o mundo? Que o amor que age no mundo em benefício dos outros, independente das diferenças entre os homens, é o remédio necessário, o bálsamo oferecido pelo Criador, para os sofrimentos e perigos que recorrentemente põem em risco a frágil Humanidade.
Nada mais atual.






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