quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Il poverello


(ao terminar de ler o livro São Francisco de Assis, de Hermann Hesse)


O oceano do dia deixa-se escoar no horizonte
Refluindo à sua ancestral fonte, a noite atemporal.
Tremem as árvores, a brisa fria descende do monte,
Encolhem-se corpos e almas, desamparo total.

E o que fora brisa de repente faz-se vento
Congelando o mundo inteiro e o pensamento.

Ai dos desajustados, dos sem teto, sem consolo,
Ai dos sem afeto, que vagam na vida por migalhas.

Abre-se, então, a portinhola de minúsculo casebre e a luz
Que denuncia um fogo capaz de amainar o frio do mundo
Espalha no negror o alaranjado tom de aconchego e conforto.

Abandona a cabana, sem temer a tormenta, o Pobrezinho
Levando, a quem não tem, algo de roupa e sopa e carinho
A tornar-se o sol da vida para um mundo obscuro e torto.




quarta-feira, 25 de setembro de 2013

tristezas


há um lamento da vida
em cada despedida
como o choro de um cão
esquecido
numa casa vazia,
ou o silêncio
de uns risos que houve
em outros melhores dias.
há toda a tristeza
numa casa abandonada
que foi um ninho de sonhos
dos quais já não resta 
nada.




sexta-feira, 13 de setembro de 2013

julgamentos


A tua cara sorrindo enquanto trais o teu povo
Esconde a alma, serpente saindo da casca do ovo,
Tua verdadeira face, descrente recitador da bíblia,
A obedecer quem te paga e acumulando uma dívida.

A  bandeira que levantas é a mesma de quem corrompe
E furta a liberdade para usufruto de uns poucos.
É o símbolo da vergonha que seguirá os teus passos
Como capacho de déspotas e panegirista dos loucos.


“Não penses que não ecoa o que és, fazes ou dizes.
O que semeamos na vida é em nós mesmos semeado.

A serpente que tu libertas procriará ao teu lado
A envenenar o teu futuro por gerações infelizes.“

Disse um sábio.



domingo, 1 de setembro de 2013

liberdade


Domingo de manhã, numa rua em Porto Alegre
Inspiro a brisa fria azul prateada nas narinas
E sinto, como senti, desde guri, a liberdade
Que me ensinou a ser na vida o que eu bem quis,

A correr riscos num rumo incerto e surpreender-me
Com as descobertas do que eu era e não sabia.
Ah! liberdade, só tu permites que eu me torne
Conhecedor de algum mistério que haja em mim.

Sem liberdade sou engrenagem de um poder,
Fiel de rebanho, coisa sabida, bicho em criadeiro, 
Objeto, presa de uma crença, ou livro, ou lei,

Mas, sendo livre, sou o autor da minha história,
Semeador das próprias mágoas, ou das vitórias,
A transformar tudo que sou no que eu nem sei.