domingo, 29 de março de 2015

início de outono

Uma tarde perfeita, morna quase fria
Fios de sol flutuam ao sopro da brisa
Ruas silenciosas sussurrando poemas
Flores revelando tons de rosa e prata

Por aqui andamos banhados de ouro
Beijados de sol sobre a roupa pele
Inflados de vida sob a pele corpo
Somos uns balões a flutuar no alto

Olhando a vida lentos longes leves
A sintetizar alma como que num parto
Do filho do amor de invisíveis deuses

Tarde de uma vida silente ao lado
Bela companheira que já foi paixões

Hoje amor luzindo sem queimar aquece




domingo, 22 de março de 2015

ecce homo

(lembrando o filme A Liberdade é Azul, de Krzysztof Kieslowski)


Ouço o coração a dizer

 “É tempo!“

E os músculos, e as tensões, os intentos
Já, ou não, vividos,
Os olhos, os ouvidos, sussurrando
A todo momento 

“É o tempo!“

E os sonhos, as idéias, pirações e inspirações,
Os ritmos de fora coincidindo com os do centro,
As memórias e recordações brotando de dentro

“É chegado o tempo!“

E as emoções profundas, as sensações mais fundas,
O sentimento de amor que conheci na vida,
E os pressentimentos de um futuro,

Um futuro a sorrir, dizendo “Olha!

São chegados os tempos!“

Olho, e vejo, a imensa fauna humana
(Que conheço bem na sua competência
de criar miséria e guerra)
Agora a produzir com a Ciência a cura
Da peste e da alma perdida na insciência.

Não mais bicho apenas. Homem!

Vejo um Anjo que nasce do coração do Homem
Cantando a sinfonia com palavras de Paulo,
Em adoração ao que criou as cordas geradoras
Das múltiplas dimensões do espaço-tempo.
Vejo a Mente despertando de um sono
Profundo que era gritos, pesadelo,
E esta mente silenciada enfim descobre
A voz da vida no que pensava ser 
O silêncio do Nada.

Vejo os Estados-nação desfeitos
E os povos, então, irmanados agora, 
Entoando juntos neste cântico, o poema:

“Quando eu era menino, falava como menino,
sentia como menino,
discorria como menino,
mas, logo que cheguei a ser homem,
acabei com as coisas de menino.

Porque agora vemos por espelho em enigma,
mas então veremos face a face;
agora conheço em parte,
mas então conhecerei como também sou conhecido.

Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, 
estes três, mas o maior destes é o amor.“ *

Hoje vejo mais claro a face do Homem,
Livre de dogmas e atavismos de credo e raça,
E das ideologias...

O tempo, 

O mundo novo,
É chegado:

Eis o Homem!


* Paulo, Carta aos Coríntios 13 

domingo, 15 de março de 2015

15 Março 2015

Cruz e Souza, Bilac, Rui Barbosa,
Millor, Ulisses, Francisco de Lisboa.
Cora Coralina, Villa Lobos, Tom Jobim,
Chico Xavier, Irmã Dulce, Antonio Vieira.

Zilda Arns, Gullar, Augusto dos Anjos,
Getúlio, Manuel Bandeira, Tiradentes.
Machado de Assis, Juscelino, Bonifácio,
Cesar Lattes, Dumont, Osvaldo Cruz.

Landell de Moura, Tancredo, Lobato,
Pedro Segundo, Rondon, Gregório de Mattos.
Vital Brasil, e tantos Zecas, Jorges e Joãos
Tantas Marias, outras Anas e Esteres.

Há nestes corpos de homens e mulheres
Uma Alma a lançar-se em ascese
Porque sonha algo além do que parece:

A grandeza que sabe ser singela,
 A Ciência que não despreza a prece.


sábado, 14 de março de 2015

desatando (com agradecimento a Fernando Pessoa no final)




Hoje desato os nós que me atavam
Atavismos, ativismos, triste sina
De quem não sabe ver aquilo que é,
Como não sabe ser o que lhe brota afora,
E se enrola em teorias não vividas,
Embota-se pelos medos desta vida
E morre em alma, a mente aos gritos!

Hoje eu silencio a olhar o mundo,
A olhar-me, reconhecendo o todo:
O meu espírito em corpo inteiro.
Terra e ar e água e fogo. 

Apolo e Dioniso.


E tudo o mais 
Que nesta vida é (im)preciso.








domingo, 8 de março de 2015

templo da poesia

Onde foste te esconder, minha poesia,
Nestes dias em que estou a singrar mares?
Pensas que ao lutar não mais te quero?
O argonauta volta sempre à interna Pátria.

Regressa sempre ao silêncio após o ruído,
Às sombras do teu templo, perfumadas,
Onde as memórias de tempos esquecidos
Compõem odes às vidas e às estradas.

Então volta a poesia, e vem sorrindo
Com um braço estendido a me buscar.
Vem cantando um hino órfico a Dioniso.

E nos damos as mãos, a olhar a estrela
Que recorda outra morada no Universo

E da saudade a fluir versos brota o mar.